As teorias recentes defendem que pode haver uma predisposição individual para o suicídio, que é ativada, ao longo da vida, por experiências negativas precoces (experiências traumáticas) que vão dar origem a um padrão de pensamento negativo. Os números apontam-nos um grande culpado. Mais de 50% das pessoas que se suicidaram sofriam de depressão. Contudo, José Manuel Temóteo, psiquiatra, explica que o quadro depressivo não está sozinho no banco dos réus.
«O suicídio pode constituir uma reação de inadaptação a uma mudança ou um ato de vingança que sublinha o rancor», refere. Os cinco mil suicídios registrados quando da tomada de Berlim, no fim da Segunda Guerra Mundial, são exemplo disso. O próprio Adolf Hitler, um psicopata sem qualquer capacidade de remorso ou compaixão, suicidou-se. Independentemente das causas, o suicídio resulta sempre da consolidação de emoções negativas e de estresse.
Situações de separação, divórcio, luto recente, solidão, desemprego, mudança ou perda recente de trabalho, problemas escolares ou laborais, doença grave ou crônica e dependência de drogas e álcool podem, efetivamente, resultar numa resposta negativa e conduzir ao suicídio. «O que encontramos nos suicidas é a associação de um alto grau de desesperança a uma grande incapacidade de resolver problemas», refere o clínico.
Questão psicológica
O perfil psicológico do indivíduo desempenha um importante papel na forma como reage às circunstâncias que lhe vão sendo oferecidas ao longo da vida. Há, no fundo, um mecanismo de adaptação que se cumpre de forma mais adequada ou menos adequada e que pode, inclusivamente, ser variável ao longo do tempo. Numa entrevista que concedeu ao jornal The Guardian, em 2010, Robin Williams referiu, a propósito da cirurgia cardíaca a que tinha sido submetido, que «se sentiu totalmente mortal» e que essa sensação de mortalidade o intimidou.
«A vida é uma benção?», perguntaram-lhe. «Totalmente», respondeu. A decisão irreversível que tomou revelou uma absoluta mudança de perspetiva, a vida como caminho de dor, de intransponível angústia. Em 2006, após uma recaída alcoólica, Robin Williams dizia que «um alcoólico está sempre no fio da navalha, tem de se equilibrar em permanência para não cair». Mas por vezes há uma voz que diz «Salta», frisava. E o que o faz saltar? «O medo. E a solidão», retorquiu.
A morte como solução para todos os males
A vida é impermanente, a capacidade de adaptação às circunstâncias pode ser bastante variável. O que acontece no suicídio é que a morte consolida a solução, petrifica a vida, terminando-a. O suicídio é o ato mais individual do ser humano. Contudo, como qualquer fenômeno humano, implica um entendimento bio e psicossocial. Para lá das características psicológicas do indivíduo, há que ter em conta as suas dimensões sociais e biológicas. O isolamento, a sensação de desintegração social e de não pertença detêm um peso significativo na decisão suicida.
O que revelam os números
Os índices revelam que as pessoas sozinhas, solteiras, divorciadas ou viúvas se suicidam mais do que as outras. Pessoas com redes sociais de apoio, com família próxima e amigos chegados, que estabelecem laços fortes têm mais hipóteses de receber ajuda no caso de estarem em crise. Além disso, a existência de padrões sociais no suicídio indicam que há critérios de sazonalidade, geográficos, laborais, de gênero (feminino e masculino), etários, entre outros, a ter em linha de conta.
A Sociedade Portuguesa de Suicidologia traça o perfil do suicida típico. É homem, tem mais de 45 anos, tem intenção suicida, usa métodos letais como o enforcamento, arma de fogo ou veneno e premedita o ato. É viúvo ou divorciado, está desempregado, vive no sul do país. Não se suicida na primavera, vive em localidades menores, está deprimido em mais de 50% dos casos, padece de alcoolismo, vive isolado e sofre de doença crônica.
Já o para-suicida, autor de um suicídio não consumado, é do sexo feminino, tem menos de 25 anos, é casado e está empregado. Tem uma intenção manipulativa e usa como método letal cortes ou psicofármacos. A tentativa de suicídio corresponde a um ato impulsivo. Vive em qualquer parte do País, e o ato não corresponde a um padrão sazonal. Vive em localidades maiores, urbanas.  A depressão está presente em menos de 50% dos casos e é frequente padecer de um distúrbio da personalidade, um conjunto de características que revelam má adaptação nas relações interpessoais e fraca capacidade crítica.
Há ainda indicadores que apontam para a existência de um importante fundo genético na questão suicida. Por um lado, porque o suicídio se encontra relacionado com a doença mental grave, muitas vezes de natureza hereditária, por outro porque há evidência de histórias familiares de suicídio. A revista Time refere que foi recentemente identificado um gene (SKA2) bastante importante no controle dos sentimentos negativos e no controle da impulsividade que, por este motivo, pode interferir na ideação suicida.
Ato planejado ou impulso fatal?
O suicídio pode demorar a ser pensado e planeado ou constituir um ato impulsivo, consumado num momento. De acordo com o Instituto Português de Suicidologia, a impulsividade é um dos fatores mais importantes no suicídio, uma vez que a rapidez com que se passa do pensamento ao ato pode constituir um fator de risco acrescido. Nos jovens, a impulsividade detém um importante papel.
Os adolescentes vivem com grande intensidade o momento presente, não tendo grande capacidade para se projetarem no futuro. Interessa o agora, com toda a carga positiva e negativa que o agora detém. Os dados estatísticos indicam que, em comparação com a restante população, os adolescentes apresentam uma elevada taxa de tentativa de suicídios mas uma menor taxa de suicídios consumados. Quadros de depressão, abuso de substâncias tóxicas, esquizofrenia, doença bipolar e outras perturbações mentais estão presentes em grupos que revelam um maior índice de suicídios. Em comum têm a desesperança. Aquilo que parece ser transversal aos suicidas é a falta de esperança, o sentimento profundo de uma angústia sentida como sendo irremediável.
Desespero e angústia
De acordo com o Instituto Português de Suicidologia, há aspectos fundamentais que estão na base da ideia do suicídio e da sua concretização. O suicida encontra-se envolto numa dor psicológica intolerável, revela perda de autoestima e incapacidade para suportar a dor psicológica, contempla menos horizontes e desempenha menos tarefas, revela isolamento (sensação de vazio e de falta de amparo), desesperança e egressão (fuga como única solução para acabar com a dor intolerável). Há ainda situações (como o estresse de guerra) que potenciam o risco de suicídio.
O estresse pós-traumático pode evoluir para quadros depressivos que se encontram associados a fortes sentimentos de desesperança. «Vivenciar uma experiência de total perda de controle sobre o seu desfecho, uma situação de perigo de morte iminente, é profundamente dramático e pode tornar-se numa situação patologizante», afirma José Manuel Temóteo. O que parece acontecer é que se o passado é depressão e o futuro é ansiedade, o medo incontrolável e crônico é a porta de entrada de perspectivas negativas em relação ao futuro e um dos principais fatores de risco e preditores de suicídio.
A importância dos sintomas
«A capacidade de avaliar o risco de um doente se suicidar é», de acordo com mesmo especialista, «a competência clínica mais exigente que um médico psiquiatra tem de adquirir». Sintomas como desesperança, humor deprimido, sentimentos de culpa e/ou fracasso, desespero, inquietação ou agitação, insônia persistente, perda de peso, gestos lentos, discurso pobre, cansaço, isolamento social e ideação suicida (com plano definido) requerem atenção extrema. É ainda necessário dar especial atenção às pessoas que já tentaram suicídio anteriormente, indivíduos com história familiar de suicídio, adolescentes com depressão ou distúrbios de conduta e idosos nas fases iniciais de demência e estados confusionais.
Ao contrário do que vulgarmente se pensa, dois terços dos suicidas expressam as suas intenções, sendo que um terço procura o médico um mês antes do suicídio, pelo que comentários acerca da morte e do suicídio são sinais preocupantes. É frequente as pessoas com comportamentos suicidiários darem sinais de alarme (preparar documentos, dar objetos pessoais de valor sentimental elevado, escrever cartas ou notas aos amigos) consciente ou inconscientemente, o que indicia a esperança de serem salvas.
É necessário perceber que o suicídio é sobretudo o meio que encontram para dar fim à sua dor, o objetivo principal é parar o sofrimento e não exatamente por fim à sua vida. Quando ajudadas a tempo, as pessoas podem entender que há outras formas de resolver as suas circunstâncias e que há quem se encontre empenhado em ajudá-las. Mas também há casos em que o suicida quer realmente morrer, não dando qualquer sinal para não levantar suspeitas. Estes são, sem dúvida, os casos mais difíceis de prever e de intervir.
O aumento das taxas
O aumento das taxas de suicídio nos Estados Unidos (os valores rondam os 30% entre 2002 e 2011) e em alguns países da Europa, nos últimos anos, requer que se olhe para um conjunto de fatores. Os sociólogos consideram que o aumento desta expressão suicida pode estar relacionado com o tipo de vida dos nossos dias, centrada na internet e na ilusão de presença concedida pelas redes sociais, para além dum crescente número de adições a substâncias nocivas. De acordo com Ana Teixeira Pinto, socióloga, «hoje, nada tem um valor realmente importante e duradouro».
«A ideia é que tudo passa, mas sem que se construam verdadeiros laços, sem que se construa um real sentido com as coisas e as pessoas», refere ainda a especialista. Fundamental mas difícil, a prevenção passa, para além do diagnóstico e tratamento das perturbações mentais, pela implementação de estratégias a longo prazo, como proporcionar uma boa educação às crianças e adolescentes, controlar os fatores de risco e consciencializar a população.
Hollywood está deprimido?
A história dos suicídios das estrelas de Hollywood teve início em setembro de 1920, quando Olive Thomas, uma das atrizes mais importantes da época, foi encontrada morta sobre uma cama de plumas de ganso, na suite real de um prestigiado hotel. Tinha 26 anos e chegou a ser considerada a «mulher mais bela do mundo». Estava no auge da sua fama e da sua carreira. Depois dela, foram muitos aqueles que puseram fim a uma vida que, à distância, parecia repleta de prestígio, beleza, riqueza e glamour.
Apesar das mortes no meio artístico terem uma maior visibilidade e, por isso, induzirem à ilusão de que serão mais frequentes, José Manuel Temóteo remete para um traço importante daqueles que povoam o meio artístico. «Poderemos especular que existirá, nas pessoas mais criativas, dedicadas ao meio artístico, alguma psicopatologia, habitualmente de caráter afetivo, para além de distúrbios da personalidade. Quando associados a uma clara tendência para o consumo exagerado de substâncias tóxicas (drogas e álcool), que é sabido acontecer no meio artístico, estamos diante dos fatores que potenciam o risco de suicídio», diz mesmo.
Suicídio no mundo
A taxa de suicídios por 100.000 habitantes em 2012 nos países com mais suicídios em todo o planeta foi de 44,2 na Guiana, 38,5 na Coreia do Norte, 28,9 na Coreia do Sul, 28,8 no Sri Lanka e 28,2 na Lituânia. No topo da lista de países com menos suicídios, surge a Síria e a Arábia Saudita com 0,4, seguidos do Líbano e do Kuwait com 0,9 e Jamaica com 1,2. Portugal regista uma taxa de 8,2, segundo a Organização Mundial de Saúde.
Suicídios ao longo da história:
– 1849: Edgar Allan Poe, escritor, foi encontrado em coma alcoólico por suposto suicídio.
– 1890: Vang Gogh, pintor, suicidou-se aos 69 anos, com uma arma de fogo, em virtude de surtos psicóticos e instabilidade mental.
– 1930: Florbela Espanca, escritora, suicidou-se com veronal, o medicamento que tomava para dormir, na sequência da morte do irmão. Já havia tentado o suicídio duas vezes.
– 1939: Sigmund Freud, médico psicanalista, suicidou-se aos 83 anos em consequência do sofrimento provocado por um cancro na garganta.
– 1941: Virgínia Woolf, atriz, vítima de colapso nervoso, deixou uma carta ao marido onde explica que sabe que está a ficar novamente louca. Ouve vozes e não consegue concentrar-se. Vestiu um casaco largo, encheu os bolsos com pedras e atirou-se ao rio.
– 1945: Adolf Hitler, nos dias da rendição alemã, no final da Segunda Grande Guerra, administrou veneno a Eva Braun, sua companheira. De seguida, suicidou-se com um tiro.
– 1961: Ernest Hemingway, escritor, suicidou-se aos 61 anos. Consta que a mãe lhe havia enviado, por correio, a arma com a qual o pai de Hemingway se suicidara. Doente e com problemas financeiros, Ernest Hemingway acaba por usar a mesma arma e seguir o mesmo caminho do pai.
– 1962: Marilyn Monroe, atriz, suicidou-se aos 39 anos com barbitúricos. Supostamente fora intimidada pela CIA e pelo FBI para conseguir provas contra John Kennedy.
– 1977: Maria Callas, cantora lírica, suicidou-se com mandra, um poderoso hipnótico. A morte do marido, Aristoteles Onassis, potenciou-lhe o sentimento de profunda solidão.
– 1994: Kurt Cobain, cantor e vocalista da mítica banda de grunge Nirvana, suicidou-se aos 27 anos, com um tiro. Sofria de adição à heroína.
– 1997: Michael Kelland John Hutchence, vocalista da banda INXS suicidou-se num quarto de hotel em Sidney, na Austrália.
-2010: Alexander MCQueen, designer, suicidou-se aos 41 anos, por enforcamento, nas vésperas do funeral da mãe.
Texto: Ana Celeste, via Sapo

As tentativas de suicídio ou sua prática efetiva envolvem sempre uma grande dose de sofrimento, tensão, angústia e desespero. Esta dor da alma pode ser real ou ser a conseqüência de uma crise de natureza afetiva, de uma conturbação mental, como, por exemplo, a psicose no seu grau mais agudo, ou de uma depressão com sintomas delirantes. Se estes estados alterados da mente vêm acompanhados do consumo de drogas e de álcool, a ação é potencializada significativamente, o que torna a atitude suicida praticamente inevitável. O indivíduo pode ou não deixar uma explicação de seu ato para familiares e amigos, através de uma nota ou de uma carta.
A palavra suicídio foi criada em 1737 por Desfontaines. Com origem no latim – sui (si mesmo) e caederes (ação de matar) -, ela aponta para a necessidade de buscar a morte como um refúgio para o sofrimento que se torna insuportável. Esta ação voluntária e intencional parte do ponto de vista que a morte significa o fim de tudo, um mergulho no nada, visão esta acentuada pelo viés materialista que envolve a nossa civilização. O suicídio pode ser concretizado através de atos mais agressivos - geralmente uma escolha masculina -, como tiros e enforcamento, que conduzem quase sempre à morte; ou por ações mais amenas, normalmente uma opção feminina, como o uso de remédios ou venenos, que nem sempre conduzem a um desenlace fatal. Pode haver também casos de prática suicida quando o sujeito deixa de prover certas necessidades fisiológicas, um ato gradual, como se negar a ingerir o alimento.
Geralmente a sociedade responde a essas atitudes com o véu do silêncio, como se estive lidando com um tabu, ou seja, um assunto sobre o qual deve pairar, com a cumplicidade implícita de todos, um voto de não discussão, de negação do debate e de um mergulho mais profundo em seus meandros. Mas em alguns lugares, como, por exemplo, nos Estados Unidos, ele é considerado um problema social, e muitas vezes também de saúde pública, já que suas estatísticas apontam altos índices de ocorrência. Anualmente acontecem por volta de trinta mil mortes por suicídio, enquanto as tentativas, que nem sempre visam a morte, revelam um grau de ocorrência 8 a 10 vezes maior. O suicídio é simplesmente a oitava causa mortis neste país.
Algumas causas do suicídio estão ligadas ao gênero sexual – as mulheres normalmente tentam mais o suicídio que os homens, embora estes morram mais por conta desta ação, justamente por recorrerem a atos mais agressivos. Grande parte dos suicidas está na faixa dos 15 aos 44 anos, e doenças como câncer, epilepsia, AIDS ou perturbações mentais são os maiores fatores de risco para essas atitudes suicidas. Sem dizer que estas ações costumam se repetir, ou seja, o suicida volta a tentar quando sua primeira tentativa foi frustrada. Às vezes o suicida responsabiliza as pessoas à sua volta por sua decisão, assim sua morte vale como um castigo para os que o cercam, como se ele estivesse se vingando das agressões recebidas de seu meio ambiente.
A maneira como a sociedade reage ao suicídio varia de acordo com a cultura vigente e também no que tange ao período histórico em questão. Na Roma antiga, a morte não significava muito, era mais importante o meio de morrer, como um ato digno e realizado no momento certo. Entre os primeiros cristãos, morrer significava libertar-se deste mundo de dores e sofrimentos, dos pecados. Assim, a morte era como tomar um caminho mais curto que conduzisse ao Paraíso. A história mudou nos séculos V e VI, nos Concílios de Orleans, Braga e Toledo. Estes encontros deliberaram uma mudança de rumos, proibindo qualquer homenagem aos suicidas, e mesmo aqueles que só tentavam e não conseguiam êxito, eram excomungados. Assim, o suicídio tornou-se um crime e um hediondo pecado, e suas conseqüências poderiam agora se estender inclusive aos familiares, que enfrentavam preconceitos e perseguições. Somente no Renascimento, uma época mais romântica, o suicida foi resgatado e em torno dele instituiu-se uma aura de respeito e de um certo fascínio.
O ato suicida é, portanto, considerado um pecado em algumas religiões e um crime em certas legislações. Mas em algumas culturas, como a japonesa, esta atitude pode ser considerada uma forma digna de fugir de contextos que envolvem vergonha e culpa, como o harakiri, praticado antigamente entre os guerreiros samurais. Mas a alta taxa de suicídio entre os jovens é o que mais preocupa hoje nossa sociedade. Entre os 15 e os 24 anos, ele já se encontra no terceiro lugar nas causas da morte, logo depois de acidentes e homicídios. Seus conflitos interiores são geralmente desencadeados pela forma como são educados, pelo ambiente familiar. Neste meio os jovens podem se deparar com a imposição de sentimentos de culpa, através de terríveis chantagens emocionais, com violência doméstica, ausência familiar, abandono, carência, superproteção, baixa auto-estima, entre outros fatores. Infelizmente estas ocorrências são muito comuns, e geralmente divorciam estes seres de sua própria alma, eles se tornam criaturas cindidas e despersonalizadas, e muitas vezes não conseguem conviver com as angústias e dores que acometem sua anima. Desmotivados e em profundo desequilíbrio, eles buscam refúgio na morte.